terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

Mário Crespo, novel efígie do nosso descontentamento



Imagem do KAOS

Cheira mal em Portugal, e o cheiro não é de hoje, mas o dia a dia dos episódios rocambolescos vai se progressivamente aproximando do paroxismo das barracas de feira, e dos carrinhos de choque.
Como todos os impérios dos pés de barro, o Sr. José Sócrates Pinto de Sousa lida mal com a crítica e o humor. Sabe que só sobrevive dentro da couraça de uma miragem, e de um estranho ventilador, que diariamente lhe ilude a Realidade.
O problema do Sr. Sócrates não é de hoje, é um problema de má consciência, muito antigo, que começa nas suas origens, resvala pela sexualidade, atravessa os maus atos da governação, os negócios escuros de todos os inconfessáveis conluios, e, como todas as pessoas habilitadas à pressão, tem, ainda por cima, o terrível complexo de saber que nunca obteve uma licenciatura, mas um reles... diploma.

Há tempos que circulam, por email, textos de Mário Crespo, crescentemente verrinosos, e, bastantes vezes, certeiros. Para todos nós, enfim, os poucos, que têm alguns contactos com os bastidores da Informação, sabe-se que o que vem a público não é senão uma pequena parcela distorcida de coisas inenarráveis, que, postas lado a lado, nos revelariam um pântano de sufoco e inquietação.
Várias vezes li fragmentos de Mário Crespo e fiz um juízo de valor algo injusto, por ver naquela escrita um "Arrebenta" sem graça, embora mais certeiro e justicilaista, ... mas, o assumir de um tom daqueles ia muito além dos factos narrados, e mergulhava já numa necessidade de ser tronitruantemente CONTRA um estado de coisas de que nós nem faríamos a mais pálida ideia.

Hoje, foi o clímax, como já tinha sido com Manuela Moura Guedes, com José Manuel Fernandes, e tantos outros, que ocuparam aqui uma página inteira.

Portugal, por causa dos calcanhares de aquiles de uma Seita, mergulhou no Medo, e essa seita deitou-se a jogar no tudo por tudo, porque o Partido Socialista, ou, melhor, o alien que se instalou no corpo do Partido Socialista sabe que, uma vez perdido o Poder, ficará dele arredado por muitos e longos anos, e é bem feito.
Em meu redor, são centenas, e em redor dessas centenas, já há milhares, mesmo milhões de pessoas, que, em circunstância alguma, voltarão a votar PS, por mais dourada que se lhe apresente a pílula.
Outros, como José Maria Martins, foram mais audazes, e resolveram apresentar, judicialmente, uma impugnação do... "diploma". De aqui lhe bato a pala, e faço continência, pela audácia.

Com Mário Crespo, volta à baila o problema central da Liberdade da Expressão. Portugal fervilha de gente que prefere uma má história a um retrato abreviado da Realidade. Hoje, mal o escândalo tinha rebentado, já os canais oficiais de propaganda estavam na Metafísica da Bola, e, talvez por não ser dia 13, pouparam-nos -- vá lá -- andar a lamber o cu à Santa Saloia de Cara de Porcelana. Katia Guerreiro, por pudor, não cantou o Fado, aliás, acho que ela nunca cantou, mas isso não é agora chamado para aqui.

Mário Crespo enveredou por uma linguagem extrema, e tornou-se num alvo do Sistema, que pouco mais tolera do que a bajulação, a notícia comprada num jornal cor de rosa sobre os namoros femininos de um homem que não gosta de mulheres e não suporta que isso se lhe cole à pele plastificada de Primeiro Ministro, e aqui começam as impertinências do que será a História futura, quando, aqueles que, de entre nós, nos perguntarem como foi o nosso tempo, tiverem de obter estranhas respostas.
"Então o avô viveu num tempo em que se soube que o Primeiro Ministro tinha arranjado um diploma falso?... Conte lá como foi... Ele demitiu-se, e o que é que aconteceu depois?... ", e nós, engasgadamente, lá teremos de explicar a realidade, "não, ele não se demitiu, desmentiu, e pôs um da laia dele, do "lobby gay", a... fechar a Universidade, e a arquivar as provas todas...",
"ah, estranho...", dirá o netinho, e continuará,
"ó, avô, diz que no teu tempo se compravam árbitros e decidiam jogos, pagando com dinheiro e prostitutas... É verdade?... E prenderam alguém?...", e lá teremos de explicar que, em vez de se prender alguém e fazer uma auditoria a tudo o que jazia e subjazia à sujidade do Futebol, tivémos um Procurador Geral da República que, pelo contrário, desencadeou uma investigação sobre... quem teria posto as escutas na Net (?).
"Ó, avô, é verdade que os políticos abusavam sexualmente dos órfaõs da Casa Pia?... E prenderam-nos?... Isso é muito feio, violar criancinhas, o avô não ia deixar que me violassem a mim, pois não?...", e nós lá teríamos de responder, engasgadamente, que "dependeria muito da posição ocupada no Estado pelo violador, mas o avô depois explica, quando tu fores mais crescido, está bem..."

Mário Crespo encrespou-se, e passou das ideias às palavras crispadas, verbalizando toda a crispação que este clima de podridão estava a espalhar, diariamente, em mancha de óleo, sobre toda uma sociedade traumatizada, amordaçada e silenciada, o Portugal do início do séc. XXI.

Silva Pereira, Jorge Lacão, Augusto Santos Silva e outros quejandos fazem-nos lembrar a Chicago dos Anos XX. É verdade que, quanto a esses, compraram, mataram, e chegaram a viver num esplendor do Negativo, que fascinava toda uma sociedade, siderada, pela impunidade das atividades do Grupo.
100 anos são quase passados sobre essa porcaria.
Essas Bonnies and Clydes acabaram com um tiro na testa, quando as gentes deles se fartaram. José Sócrates quer enterrar consigo o Regime, e é lícito, já que os 100 anos de desastre da República talvez o mereçam.

Ouvir, ontem, Cavaco Silva, um ignaro da província, citar Guerra Junqueiro, que, se fosse vivo, o teria cilindrado em meia dúzia de quadras, foi, para mim, outro paroxismo do grau de invalidez da Coisa Pública.
Mário Crespo é apenas mais um episódio. Acontece que há certas gotas que fazem transbordar o copo de vez.
Por mim, podia ser já hoje.

(Afinal, o Quarteto era de Mafiosos, no "Arrebenta-SOL", no "Democracia em Portugal", no "Klandestino" e em "The Braganza Mothers", solidário com Mário Crespo)

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